domingo, 28 de outubro de 2012

Mulheres agredidas ainda têm medo de denunciar

Por Gabriella Ribeiro, Izabela Fonseca,
Maristela Rosa, Natália Ferreira e
Priscilla Helena


A cada 15 segundos, uma mulher apanha. A violência contra a mulher ganha cada vez mais destaque nos cenários estadual, nacional e mundial. Mas a agressão contra o gênero feminino não ocorre apenas em caráter físico, como também no psicológico, intrafamiliar, de gênero, de etnias e através da chamada violência simbólica.

A Lei Maria da Penha, criada em 2006 em homenagem a Maria da Penha Maia Fernandes, que foi espancada pelo marido durante seis anos e acabou ficando paraplégica em uma tentativa de assassinato, protege as mulheres contra os diferentes tipos de violência, mas ainda deixa algumas brechas para as ações criminosas. 

A Lei “Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências.” – Texto da Lei 11.340, a Lei Maria da Penha.

Delegacia de Mulheres de Juiz de Fora. (foto: Priscilla Helena)

A delegacia de mulheres de Juiz de Fora é especializada na apuração de crimes de violência doméstica e de violência contra o idoso, de acordo com o delegado Rodrigo Ribeiro Rolli. Segundo ele, não é possível afirmar, ainda, se houve uma diminuição efetiva do número de ocorrências de violência doméstica, se comparado aos últimos anos. 
"Existem políticas e condutas policiais com a finalidade de diminuir e de efetivar essa diminuição. Mas eu falo também como professor universitário e posso dizer que o problema de violência doméstica é, antes de ser um problema de Polícia e de Justiça, de saúde pública, e não de segurança pública. Eu, como delegado, vejo a necessidade de efetivação de políticas públicas de saúde no trato de um dependente químico, por exemplo", destaca Rodrigo Rolli. 

 

Rolli deixa claro que o principal objetivo da Lei Maria da Penha e dos direitos das mulheres é o de acabar com a violência contra elas, mas esse ainda é um passo a ser dado. "A Lei inovou muito a legislação dos direitos das mulheres, mas ainda existem muitos mecanismos que não temos como aplicar. Por exemplo, ela prevê que uma mulher agredida tem o direito de ter um policial 24 horas junto dela, mas isso só é possível em filme americano, pois no Brasil nós não temos um efetivo policial que dê conta disso", afirma. 

O delegado fala sobre a função da Delegacia de Mulheres, enquanto parte da Polícia Civil.


De acordo com informações da Delegacia de Mulheres de Juiz de Fora, são registrados cerca de 250 a 300 casos de agressão a mulheres a cada mês. O delegado explica em que época as ocorrências são mais frequentes e o porquê.


Ele afirma, ainda, que algumas mulheres utilizam da Lei Maria da Penha para chegar à separação dos maridos e, "ao invés de pedirem a separação de corpos, elas apelam para outros métodos, entram com as medidas protetivas e dali já são encaminhadas para a separação".

Mas vale ressaltar que existem outros tipos de violência contra as mulheres, como a simbólica e a psicológica. Para a professora universitária Cláudia Regina Lahni, "a violência contra a mulher em Juiz de Fora, no Brasil e no mundo infelizmente ainda é muito alta. A igualdade entre homens e mulheres, na prática, ainda está longe de acontecer". Ela explica como os diferentes modos de violência ocorrem na maioria das vezes.


Cláudia é militante do movimento feminista e explica que até mesmo algumas formas de linguagem podem ter conotação agressiva. "A ação de violência pode vir de peças publicitárias, como as de cerveja, por exemplo, mas não somente. A forma como as mulheres são representadas em programas de entretenimento na televisão e mesmo em outros tipos de comunicação aqui no Brasil também é, muitas vezes, agressiva", explica a professora.


Cláudia afirma que todo e qualquer tipo de preconceito já se caracteriza como uma forma de violência, como a homofobia. "A lesbofobia é uma violência enorme contra as mulheres e deve ser enquadrada também, dessa forma, a partir da Lei Maria da Penha". 

 

O delegado Rodrigo Rolli destaca que, ao contrário de Cláudia, ainda existe um número absurdo de mulheres que sofrem algum tipo de agressão e sequer chegam a denunciar; enquanto outras não levam o processo até o fim. Essas condutas contribuem, então, para que os agressores vivam na impunidade. 


Mas esse não é o caso da dona de casa D.M., 38 anos, que diz ter receio de denunciar o marido. “Ele não costuma me bater, mas sempre me ofende, me xinga e me expõe ao ridículo na frente dos vizinhos. Ele bebe, fuma e me ameaça de vez em quando, mas eu tenho medo de denunciar e ele fazer alguma coisa pior comigo ou com os meus filhos”, desabafa.

Um rapaz que preferiu não se identificar concorda com a dona de casa. “Há dez anos, quando eu me casei, eu tinha um ótimo relacionamento. Mas com o passar do tempo, a gente foi se desentendendo e as brigas começaram a ficar mais sérias. Eu cheguei a agredir a minha esposa, tudo por causa da bebida. Eu bebia de quarta a domingo e ficava agressivo com a minha mulher e com os meus filhos. Mas é claro que hoje eu me arrependo de tudo". 

Sonora 2 - agressor by izabelafonseca11  


Hoje ele conta que está divorciado e que teve de frequentar o grupo de Alcoólicos Anônimos (AA) para parar de beber. “Eu tinha que dar um rumo na vida, mas mesmo depois que larguei a bebida, não tinha como continuar o casamento. Depois do que eu fiz, ficaram muitas feridas no relacionamento”, afirma. Para ele, as mulheres não têm a menor chance diante de um homem agressivo.

Sonora 3 - agressor by izabelafonseca11

Mas não é preciso apenas combater as diversas formas de violência. A professora Cláudia Lahni fala de ações que podem ser adotadas para evitar que a violência ocorra e para combater e coibir as ações.


Para Cláudia, é necessário que a sociedade seja tocada pelas necessidades das outras pessoas para que seja possível, assim, que a violência contra a mulher acabe. Ou que pelo menos os agressores não saiam impunes. "É importante pra mim que eu viva em uma sociedade igualitária, onde as mulheres não apanhem e não batam e não sejam agredidas verbalmente. Em que direitos de lésbicas e de gays sejam os mesmos dos heterossexuais, ou seja, uma sociedade que tenha respeito, que não desvalorize o homem negro ou a mulher negra, que a gente viva, de fato, em uma situação de igualdade". 

Sonora Cláudia 2 by izabelafonseca11

Como denunciar
Para denunciar qualquer forma de violência, a primeira ação é ligar para a Polícia no telefone 190 e registrar a ocorrência. A denúncia também pode ser realizada em qualquer dia e horário na Central de Registro de Ocorrência. A Delegacia de Mulheres funciona de segunda a sexta, de 8h30 às 12h e de 14h às 18h, na Rua Custódio Tristão, s/n, Santa Terezinha. O telefone é 3229-5812.


Outubro Rosa nacional e discussões acadêmicas em Juiz de Fora
A campanha do Outubro Rosa, que acontece em todo o mundo e tem como base o combate ao câncer de mama, também teve o momento de conscientização e orientação a respeito da violência contra a mulher. No Paraná, a deputada Cantora Mara Lima, autora da Lei nº. 16935/11, que institui a divulgação do evento de combate ao câncer de mama, propôs uma Assembleia no Plenarinho do estado para dialogar sobre a valorização das mulheres e o repúdio à violência.

A Assembleia aconteceu na manhã do último dia 16 e teve a participação de diferentes profissionais envolvidos com o tema, como psicólogos, juízes e advogados. A iniciativa, mesmo fora de Minas Gerais, não está longe da realidade juizforana de combate à agressão.O XVIII Encontro Regional da Abrapso Minas, por exemplo, que acontece entre os dias 1º e 3 de novembro no Instituto de Ciências Humanas (ICH) da Universidade Federal de Juiz de Fora(UFJF), também trará discussões acerca do assunto, passando pelo desrespeito físico, psicológico e simbólico. O evento terá como principal pauta a psicologia social atrelada às políticas públicas. O objetivo é mostrar o que ainda pode e deve ser feito para aplicar os recursos provindos de iniciativas de Estado, no intuito de promover melhorias efetivas na qualidade de vida da população de maneira geral.
 

O encontro, de caráter acadêmico, contará com apresentações de trabalhos de autores de diversos estados e tem como organizadora a professora Juliana Perucchi, da UFJF, que também é coordenadora da regional de Minas Gerais da Abrapso. Ao todo, serão apresentados 146 trabalhos em duas modalidades – comunicação comparada e pôster, dos quais pelo menos 24 tratam, de alguma maneira, da violência contra a mulher sob perspectivas teóricas e práticas. 

Os artigos que tratam do tema irão falar, à partir da perspectiva psicológica, não só sobre a forma mais conhecida de violência contra a mulher – a física, mas trarão, por exemplo, discussões sobre gênero, etnia, sexualidade e violência simbólica.

Para mais informações sobre o evento, acesse o site.

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